As vacinas têm sido amplamente reconhecidas por sua eficácia na prevenção de condições infecciosas, mas novas pesquisas apontam que elas também podem desempenhar um papel fundamental na redução do impacto das Condições Crônicas Não Transmissíveis (CCNTs). Estudos recentes indicam que infecções virais crônicas podem estar diretamente associadas ao desenvolvimento de algumas CCNTs, e a ciência vem avançando no desenvolvimento de imunizantes capazes de atuar na prevenção desses quadros. Entre os principais fatores que levam ao aumento da preocupação com as CCNTs destacam-se:
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Envelhecimento da população: o aumento da expectativa de vida leva ao crescimento de condições associadas à idade, como demência, diabetes, DPOC (Condição/Doença Pulmonar Obstrutiva Crônica), depressão e câncer.
Mudanças climáticas: afetam a qualidade do ar, suprimentos de água e alimentos, além de alterar a distribuição geográfica de condições infecciosas.
Resistência antimicrobiana: o uso excessivo e inadequado de antimicrobianos em humanos, animais e plantas contribui para o surgimento de patógenos resistentes a medicamentos.
Capacidade dos sistemas de saúde: muitos sistemas enfrentam desafios relacionados à infraestrutura, força de trabalho e acesso a produtos médicos para prevenção e tratamento.
Essa dinâmica reforça a necessidade de inovação em estratégias preventivas, como as vacinas, que podem reduzir a incidência de condições crônicas e infecciosas. Atualmente, duas vacinas disponíveis gratuitamente na rede pública de saúde, contra o HPV e a hepatite B, se destacam na prevenção de cânceres. A vacina contra o HPV, que previne tumores no colo do útero, orofaringe e outras áreas, é aplicada em meninas e meninos entre 9 e 14 anos. Já a vacina contra a hepatite B, administrada ainda nas primeiras horas de vida, previne câncer de fígado. Ambas as vacinas têm um grande potencial de reduzir a incidência de cânceres relacionados a esses vírus.
De acordo com a Revisão do Pipeline 2024 – Inovação para necessidades não atendidas, publicada pela Federação Europeia da Indústria Farmacêutica (EFPIA), há um crescente investimento em vacinas direcionadas a agentes infecciosos que contribuem para o surgimento de CCNTs. A publicação destaca desafios emergentes na saúde pública e possíveis soluções inovadoras. O crescimento da população idosa, que deve dobrar até 2050, impulsiona a prevalência de condições como demência, diabetes, câncer e condições cardiovasculares, gerando impactos econômicos e sociais significativos. Entre os avanços promissores, destaca-se o desenvolvimento de vacinas contra o vírus Epstein-Barr (EBV), associado a condições como esclerose múltipla e certos tipos de câncer. Atualmente, três vacinas profiláticas para o EBV estão em estágio inicial de desenvolvimento e podem representar um avanço na prevenção dessas condições. Outro desafio crítico abordado é a resistência antimicrobiana (AMR), responsável por cerca de 4,95 milhões de mortes anuais. Diante dessa ameaça global, o relatório enfatiza a necessidade de novas estratégias, como o desenvolvimento de vacinas e antibacterianos inovadores, para conter sua propagação.
Outro destaque do relatório da EFPIA são as vacinas de mRNA para o câncer, que utilizam tecnologia inovadora para estimular o sistema imunológico a reconhecer e combater células tumorais. Desde 2022, dezenas de ensaios clínicos foram iniciados para avaliar a eficácia dessas vacinas, com foco em tipos de câncer agressivos e de difícil tratamento. No caso do câncer colorretal, por exemplo, há estudos avançados que podem resultar em novas estratégias terapêuticas já na próxima década.
Além disso, o relatório aponta que vacinas voltadas para a resistência antimicrobiana (RAM) também podem ter um impacto significativo na prevenção de CCNTs. Ao reduzir infecções bacterianas recorrentes e a necessidade de tratamentos prolongados com antibióticos, esses imunizantes podem diminuir o risco de complicações crônicas e contribuir para a saúde pública de forma ampla.
"As descobertas ressaltam a importância de investimentos contínuos na pesquisa de novas vacinas e reforçam o potencial da imunização como estratégia de saúde preventiva para além das condições infecciosas. O avanço da ciência nessa área pode transformar o futuro da saúde pública, trazendo benefícios tanto para as pessoas quanto para os sistemas de saúde", aparece no relatório.
O Brasil tem se destacado na pesquisa e desenvolvimento de vacinas inovadoras, com instituições como a Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz) e o Instituto Butantan liderando estudos promissores. A Fiocruz, por meio do Instituto de Tecnologia em Imunobiológicos (Bio-Manguinhos), possui um portfólio de 12 vacinas, incluindo imunizantes contra COVID-19, febre amarela, poliomielite e a tríplice viral (sarampo, caxumba e rubéola), entregando em média 120 milhões de doses anualmente ao Programa Nacional de Imunizações (PNI). O Instituto Butantan, vinculado à Secretaria de Saúde do Governo do Estado de São Paulo, é responsável pela produção de vacinas para o PNI, incluindo imunizantes contra hepatite B, raiva, influenza e outras condições. Além dos avanços em imunizantes contra condições infecciosas, pesquisas estão sendo conduzidas para explorar vacinas que possam atuar na prevenção de Condições Crônicas Não Transmissíveis (CCNTs), como câncer e condições metabólicas, com a biotecnologia promovendo avanços significativos nesse campo. O crescente envolvimento do Brasil na biotecnologia aplicada à imunização reforça sua posição como um ator global na saúde pública, com a colaboração entre o Ministério da Saúde, o Instituto Butantan e a Fiocruz sendo essencial para ampliar a produção nacional de vacinas e fortalecer o Complexo Econômico-Industrial da Saúde, promovendo a saúde da população brasileira.
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