Planos de ação para ampliar o combate às doenças crônicas não transmissíveis (DCNTs) no Brasil foram elaborados por mais de 40 autoridades e representantes dos setores público e privado, que passaram a última terça-feira (23/10) reunidos no terceiro encontro do Fórum Intersetorial para Combate às DCNTs no Brasil.
O evento contou com a presença ativa de diretores do Ministério e de secretarias da Saúde, de bancos, de indústrias e de organizações sem fins lucrativos nacionais e internacionais que apoiam pesquisas e desenvolvimento de projetos na área da saúde.
Os especialistas dedicaram o dia para traçar planos conjuntos, com metas e prazos claros, para melhorar a prevenção e o tratamento ao grupo de doenças que engloba diversos tipos de câncer, diabetes e problemas pulmonares e cardíacos. Os focos principais são a prevenção, que envolve alimentação mais saudável e mudança de hábitos sedentários, e o acesso ao tratamento de qualidade para quem já apresenta uma DCNT.
A interdisciplinaridade é ressaltada por Mark Barone, diretor do Public Health Institute no Brasil e organizador do fórum. Ele faz questão de frisar a importância de que o compromisso por reduzir a incidência de DCNTs seja assumido pelo poder público como um todo, não só pelo Ministério da Saúde, como costuma ser. “Todas as outras áreas do governo são responsáveis pela prevenção dessas doenças. É preciso entender também que o setor público não é o único responsável. A sociedade civil e a iniciativa privada têm que assumir o seu papel”, diz.
Por ter ocorrido menos de um mês depois da Reunião de Alto Nível sobre DCNTs da ONU, que ocorreu no dia 27 setembro, o encontro serviu também como uma forma de fazer um balanço das atividades desenvolvidas no Brasil em relação ao resto do mundo.
Representantes do governo e do Fórum que participaram da Reunião de Alto Nível trouxeram suas análises. A diretora de Doenças Crônicas Não Transmissíveis do Ministério da Saúde, Maria de Fátima Marinho, afirma que as diretrizes da reunião da ONU poderiam ter sido mais específicas, mas comemora que, pelo menos, não houve nenhum recuo na política de combate às doenças. O Brasil, lembra ela, se mostra na direção certa, ao ser um dos poucos no caminho de atingir a meta de reduzir em 1/3 a mortalidade prematura - de pessoas com menos de 70 anos de idade - por doenças crônicas não transmissíveis até 2030.
Marinho acredita que é hora de olhar globalmente para as mulheres e focar no combate ao uso abusivo de álcool. “Enquanto homens estão fumando menos e mantendo o mesmo nível de uso abusivo de bebida alcoólica, ambos os comportamentos têm aumentado entre mulheres”, explicou, com base em estudo do Ministério da Saúde.
Laura Cury, da ACT Promoção da Saúde, e Júlia Santos, da Alianza Latina e Abrale, concordaram que a impressão geral é de que a Reunião de Alto Nível das Nações Unidas sobre as DCNTs trouxe metas pouco ambiciosas. “Falta uma linguagem forte ao tratar da redução de consumo de produtos nocivos. Essa omissão reflete a influência da indústria desses produtos: tabaco, álcool, alimentos ultraprocessados e bebidas açucaradas”, diz Laura. A tributação de produtos não saudáveis deveria ser reforçada como uma forma de ter subsídios para saúde pública, complementa Júlia.
Mudança de hábitos
Doenças crônicas não transmissíveis são responsáveis por mais de 72% das causas de morte no Brasil. As doenças cardiovasculares e AVC, o diabetes, os diferentes tipos de câncer, e as doenças respiratórias crônicas são as que apresentam maior prevalência no país. A redução de sua incidência passa também pela mudança de hábitos. Marinho, do Ministério da Saúde, lembra que, no Brasil, atividade física reduz em 12% mortalidade por câncer de mama. E coube também aos presentes no encontro do FórumDCNTs discutir boas práticas na área.
Os programas que buscam cidades mais saudáveis, como o uso compartilhado de bicicletas e incentivo a ciclovias, foram abordados por Pedro de Paula e Hannah Machado, da Vital Strategies; Roberto Kikawa, do CIES Global; e Simone Gallo Azevedo, diretora do Itaú. O banco, afirmou Simone, investe R$ 60 milhões por ano no compartilhamento de bikes e usa o projeto “como um gerador de demanda por políticas públicas para melhorar a integração do cidadão com a cidade e gerar impacto na saúde”.
“São Paulo vem avançando no auxílio à busca por um modo de vida saudável, na mudança de paradigma para colocar a pessoa a pé e de bicicleta acima dos transportes individuais motorizados”, complementa Hannah Machado.
Parcerias essenciais
A importância da união de setores nestes avanços foi bastante ressaltada pelo professor Antonio Luiz Pinho Ribeiro, da UFMG. O potencial das parcerias público-privadas (PPPs) é enorme, diz Ribeiro, pois é possível incorporar “a inteligência e a capilaridade do setor público à eficiência do setor privado”. Ele falou sobre o Programa HealthRise, desenvolvido em parceria e com financiamento da Medtronic Foundation, que intensificou a detecção e o controle de hipertensão arterial e diabetes em regiões pobres do Brasil.
As PPPs são também o forte do médico Roberto Kikawa, que participou do evento. Ele é reconhecido pelo êxito dos programas do CIES Global (Centro de Integração de Educação e Saúde), que passou a oferecer, por meio de parcerias público-privadas, atendimento médico por exames, consultas e cirurgias de baixa e média complexidade a comunidades desassistidas.
Mas parcerias não precisam - nem devem - ser apenas entre o poder público e o setor privado. A colaboração também entre diferentes organizações do mesmo setor e incluindo a participação da sociedade civil e as ONGs que a representa é tida como essencial para o sucesso dos projetos de saúde, concordam os especialistas que se reuniram no terceiro encontro do Fórum Intersetorial para combate às DCNTs.
As melhores formas de atrair bons parceiros é mergulhar fundo para entender as necessidades locais, com foco nas pessoas que serão atingidas por ele, pontua Johannes Boch, da Novartis Foundation. Ele é responsável pelo projeto Better Hearts Better Cities, traduzido para Cuidando do Seu Coração, que busca melhorar o combate a doenças cardiovasculares na Zona Leste de São Paulo.
Envolvida no projeto, a responsável pela Supervisão Técnica de Saúde de Itaquera, Márcia Maria de Cerqueira Lima, concorda. Para ela, ter embaixadores locais, que ajudem a estruturar o projeto de acordo com as necessidades da população, é muito relevante, pois faz a comunidade “realmente vestir a camisa” no combate e prevenção às DCNTs.
O terceiro encontro do Fórum Intersetorial de Combate às DCNTs no Brasil aconteceu no Instituto do Legislativo Paulista, da Assembleia Legislativa de São Paulo (ILP - Alesp).
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