A carta abaixo foi enviada ao Ministro da Saúde do Brasil, Dr. Marcelo Queiroga, e autoridades e lideranças dos setores público (secretários/as estaduais, municipais e deputados/as), setor privado e terceiro setor, em 17 de janeiro de 2022. Leia aqui a resposta do Ministério da Saúde à Carta.
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O Fórum Intersetorial para Combate às DCNTs no Brasil (FórumDCNTs), iniciativa inter e multi setorial e multi stakeholder, fundada em 2017, através da parceria entre as principais instituições não governamentais, empresas da área da saúde, universidades, órgãos do governo, e multilaterais se reuniu em quatorze encontros durante o ano de 2021 a fim de identificar prioridades sobre as diferentes doenças crônicas não transmissíveis (DCNTs) e seus fatores de risco, assim como facilitar colaborações para a implementação, sustentabilidade e escala de estratégias custo-efetivas e políticas de saúde para enfrentá-las. Em dezembro, compilamos prioridades destacadas pelos oito Grupos Temáticos que se reúnem no FórumDCNTs e participantes convidados para os diversos eventos de 2021 - instituições listadas ao final desta carta. Os representantes das instituições participantes do FórumDCNTs contam com vosso apoio e parceria para que os aspectos aqui abordados sejam priorizados nos planos e nas ações de enfrentamento das DCNTs no Brasil, em nível federal, estadual e municipal, tanto na saúde pública quanto suplementar.
Destacamos que a pandemia de COVID-19 ampliou os desafios para a prevenção e os cuidados de qualidade das DCNTs, visto que além de pessoas com DCNTs fazerem parte de grupo com maior risco para agravamento e morte por COVID-19, muitos serviços de diagnóstico, monitoramento, consultas e procedimentos cirúrgicos foram cancelados ou adiados durante a pandemia. Como consequência, preocupamo-nos com a potencial piora da saúde dessas pessoas nesse período, resultando em complicações crônicas irreversíveis e de mais elevado custo de tratamento, assim como o aumento acelerado de novos casos de DCNTs.
A fim de que Brasil possa alcançar a meta 3.4 da agenda 2030 da ONU - reduzir em ⅓ as mortes prematuras causadas por DCNTs -, sugerimos potencializar e priorizar de imediato as ações para prevenção primordial e primária de DCNTs, e secundária e terciária para pessoas já com essas condições, através de programas e políticas de saúde, com destaque a:
Priorizar atenção à Saúde Mental e à Obesidade, melhorando a integração dessas condições aos cuidados de outras DCNTs, incluindo também campanhas públicas de conscientização e anti-estigma e melhorando a capacitação de profissionais e trabalhadores da saúde, com destaque àqueles da Atenção Primária, e de profissionais da educação, para redução de riscos, rastreio, acolhimento e tratamento.
Garantir que a Alimentação Saudável não seja um privilégio, mas um direito básico. Para isso, que haja articulação entre os ministérios e entre os setores, a fim de garantir que os alimentos saudáveis e frescos estejam física e financeiramente acessíveis para toda a população e os ultraprocessados sejam adequadamente identificados e tributados. Importante também o investimento em campanhas de massa e conteúdos escolares sobre o tema e sobre o Guia Alimentar para a População Brasileira.
Migrar sistemas de gestão e monitoramento, atualmente com dificuldade na interoperabilidade das diferentes plataformas utilizadas pelos diferentes gestores de saúde, para um modelo de digital integrado, robusto e eficiente, acessível pelos diferentes níveis de atenção, e que inclua componentes de telemedicina, teleconsultas e diagnóstico, automação, inteligência artificial e Chatbot, resultando, ainda, em registro nacional de DCNTs e big data para aprimorar programas e políticas de saúde.
Abrir o programa HEARTS para integração com outros programas de atenção à hipertensão e ao diabetes na Atenção Primária, já implementados em diferentes regiões do país, como o Cuidando de Todos e o HealthRise, a fim de expandi-lo em uma rede nacional padronizada e monitorada, beneficiando um número muito maior de usuário, aproveitando estrutura já instalada e compartilhamento de boas práticas.
Incluir e ampliar a participação especificamente de pessoas com DCNTs, não somente representantes genéricos da sociedade civil e das sociedades médicas, nas mesas de debate a decisão sobre incorporação de tecnologias, PCDTs, programas e políticas de saúde, grupos de trabalho e câmaras técnicas, seguindo o já tradicional lema de sistemas de saúde internacionais “nada sobre mim sem a minha participação” e as recomendações da NCD Alliance, do GCM/NCDs e da OMS.
Ampliar a presença de DCNTs nos currículos médicos e de outros profissionais e trabalhadores da saúde, enfatizando estratégias de educação em saúde, cuidados humanizados, e comunicação empática e não estigmatizante.
Melhorar e ampliar a atenção aos lípides com ações de redução de riscos, diagnóstico e tratamento de dislipidemia e hipercolesterolemia na Atenção Primária.
Escalar programas como o Tele-espirometria e o AbraçAr, e capacitar profissionais dos diferentes níveis de atenção através de uma linha de cuidados específica para doenças respiratórias, ampliando e melhorando a capacidade do sistema para diagnóstico, referenciamento, contrarreferenciamento, e tratamento de doenças respiratórias e outras DCNTs, a fim de reduzir subdiagnóstico, filas e altos custos das complicações resultantes dessas condições crônicas, como de DPOC, asma e apnéia obstrutiva não tratadas.
Trabalhar os temas alimentação saudável, diabetes, asma, obesidade, tabagismo, atividade física, entre outros fatores de risco e DCNTs, e literacia/letramento em saúde nos currículos escolares, desde as séries iniciais da educação básica e de forma integrada às UBSs, a fim de eliminar estigmas que já na infância podem surgir, e aumentar o engajamento das crianças, famílias e comunidades em hábitos saudáveis.
Investir em educação em saúde estruturada para que as pessoas com DCNTs desenvolvam habilidades de autocuidados e apresentem melhores resultados, culminando em prevenção secundária e terciária.
Integrar redes de atendimento através de um órgão central de planejamento, para o alinhamento otimizado dos níveis de atenção e das ações de saúde em todo o país, assim como um instituto independente do Ministério da Saúde para avaliar a incorporação de novas tecnologias.
Garantir a manutenção da desoneração do PIS/COFINS sobre medicamentos incluídos na Lista Positiva, assim como a produção contínua de radiofármacos.
Possibilitar acesso aos medicamentos incorporados mais facilitado e menos burocrático, com disponibilização em quantidade suficiente para mais de um mês e, na maioria das vezes, através da Atenção Primária, e garantir o fornecimento contínuo, sem que haja períodos de falta de medicamentos e insumos para os cuidados das pessoas com DCNTs.
Ampliar e otimizar rastreio, diagnóstico e tratamento de câncer nos diferentes níveis de atenção e regiões do país, fortalecendo ainda medidas de prevenção com tributação de alimentos ultraprocessados, bebidas alcoólicas e tabaco, e expandindo a faixa etária para a vacinação de HPV.
Firmar parcerias multissetoriais dentro e fora do governo, de forma intra e intersetorial, com participação também dos setores privado e terceiro setor, a fim de potencializar programs custo-efetivos, melhorando planejamento urbano para favorecer qualidade do ar, prática de atividades físicas, e acesso e interoperabilidade de tecnologias.
Reconhecer a Dor Crônica como uma importante DCNT com potencial incapacitante, e capacitar os profissionais, especialmente da Atenção Primária, para tratar essa condição multifatorial através de equipe multiprofissional e de forma interdisciplinar.
Desta forma, reiteramos contar com vossos esforços e compromisso para superarmos os desafios relativos às doenças responsáveis por quase 76% das mortes e 17% das mortes prematuras no país. Colocamo-nos à disposição para colaborar no fortalecimento de um sistema de saúde menos fragmentado, que precisará atender com qualidade as demandas que foram reprimidas durante a pandemia e responder ainda à COVID longa. Enfatizamos, ainda, que além da parceria entre os setores público, privado e terceiro setor da saúde, outros setores também precisarão se unir nesta batalha, visto que com o empobrecimento da população durante a pandemia, os determinantes socioeconômicos da saúde potencializaram alterações metabólicas, que, caso não controladas, levarão ao desenvolvimento exponencial de DCNTs e suas complicações. Através de parcerias e colaborações, estamos certos que será possível reverter essa tendência e melhorar a saúde e qualidade de vida da população, reduzindo custos múltiplos à toda a sociedade.
Respeitosamente,
Fórum Intersetorial para Combate às DCNTs no Brasil
Instituições que estiveram ativas nos GTs e/ou eventos do FórumDCNTs em 2021: Associação Brasileira de Apoio à Família com Hipertensão Pulmonar e Doenças Correlatas (ABRAF), ACT Promoção da Saúde, ADJ Diabetes Brasil, Amil, Amigos Múltiplos pela Esclerose (AME), Associação Brasileira de Asmáticos (ABRA), Associação Brasileira de Familiares, Amigos e Portadores de Transtornos Afetivos (ABRATA), Associação Brasileira de Hipercolesterolemia Familiar (AHF), Associação Brasileira de Linfoma e Leucemia (Abrale), Associação Brasileira para o Estudo da Obesidade e Síndrome Metabólica (ABESO), Associação Nacional de Saúde Suplementar (ANS), Associação Psiquiatrica de Brasília (APBr), Associação Umane, Abbott, Boehringer Ingelheim, Conselho Nacional de Secretarias Municipais de Saúde (CONASEMS), Conselho Regional de Enfermagem do Amazonas (COREN-AM), Coordenação Geral de Alimentação e Nutrição do Ministério da Saúde (CGAN/MS), Crônicos do Dia a Dia (CDD), DASA, Departamento de Análise em Saúde e Vigilância de Doenças Não Transmissíveis da Secretaria de Vigilância em Saúde do Ministério da Saúde (DASNT/SVS/MS), Deputados/as Federais, Faculdades de Medicina e de Saúde Pública da Universidade de São Paulo (HC-FMUSP e FSP/USP), FlexiMedical Soluções em Saúde, Fundação PróAr, Glic, Governo do Distrito Federal, Grupo de Estudo e Pesquisa Respiratória na Atenção Primária à Saúde (GEPRAPS) da Faculdade de Medicina do ABC, Hospital Israelita Albert Einstein, IBTED tecnologia e educação em diabetes, Instituto Bem do Estar, Instituto Contemplo, Instituto Cordial, Instituto Correndo pelo Diabetes (CPD), Instituto de Ciências Biomédicas da Universidade de São Paulo (ICB/USP), Instituto Desiderata, Instituto do Câncer do Estado de São Paulo (ICESP), Instituto Nacional de Câncer, Instituto Obesidade Brasil, Instituto Opy, Instituto Saúde e Sustentabilidade, Instituto Saúde Mental e Diabetes, Instituto Tellus, International Diabetes Federation (IDF), Liga de Oncologia da Escola de Enfermagem da USP (LEONCO), Liga de Enfermagem na Atenção ao Diabetes (LEAD/EE/USP), Merck, Movimento Todos Juntos Contra o Câncer (TJCC), Novartis, Novartis Foundation, Novo Nordisk, Núcleo de Estudo e Prevenção do Suicídio da Bahia (NEPS/CIATOX/SESAB), Organização Pan-Americana da Saúde (OPAS/OMS), Pé de Feijão, Plan International Brasil, Rede Brasil AVC, Resmed, Roche, Sanofi, Secretaria da Atenção Primária à Saúde do Ministério da Saúde (SAPS/MS), Secretaria de Estado da Saúde da Bahia (SESAB), Secretaria de Estado da Saúde de Goiás (SES-GO), Secretaria de Estado da Saúde de Pernambuco (SES-PE), Secretaria de Estado da Saúde de São Paulo (SES-SP), Secretaria Municipal da Saúde de São Paulo (SMS-SP), Secretaria Municipal da Saúde de Teixeira de Freitas, Sociedade Brasileira de Cardiologia (SBC), Sociedade Brasileira de Diabetes (SBD), Sociedade Brasileira de Endocrinologia e Metabologia (SBEM), Sociedade Brasileira de Hipertensão (SBH), Sociedade Brasileira de Oncologia Clínica (SBOC), Sociedade Brasileira de Reumatologia (SBR), Sulamérica Saúde, Viatris, Vital Strategies, Universidade Estadual de Campinas (UNICAMP), Universidade Federal da Bahia (UFBA), Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), World Diabetes Foundation (WDF), World Stroke Organization (WSO).
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